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3º CORPO AUXILIAR DA BRIGADA MILITAR DE 1932: ATUAÇÃO NO SETOR SUL

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Henrique Pereira Lima

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ATUAÇÃO E CRONOLOGIA

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A obra “O PÉ NO CHÃO: o pé de Palmeira no chão de São Paulo”, escrito por Nicolau Mendes nos anos seguintes ao término do conflito de 32, representa um significativo resgate da ação do corpo provisório palmeirense em terras paulistas. Obra memorialista, uma vez que Mendes serviu no 3º Corpo Auxiliar, descreve a ação da tropa comandada pelo Tenente-coronel Serafim de Moura Assis e da ação dos oficiais a ele subordinados.

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A importância deste documento é reforçada pela ausência de outras fontes documentais que tratem desta temática. Até mesmo fontes oficiais são de difícil localização e acesso. Isso deve-se, em grande parte, ao caráter “temporário” das tropas auxiliares, pois enquanto “unidades irregulares, seus arquivos ficaram em poder dos respectivos comandantes, em vez de serem recolhidos à Brigada Militar” (RIBEIRO, 1987, p. 253), e assim compor os arquivos da instituição. Esta circunstância dificulta o acesso às informações a respeito destes quadros militares e de suas ações, o que, por fim, limita a construção de um panorama mais apurado sobre sua atuação.

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A partir do arranjo temporal apresentado por Mendes em sua abordagem memorialista, é possível identificar passo - à - passo como se deu a atuação do 3º Corpo: sua criação em junho de 1932, por força do Decreto Estadual nº 5.011, de 11 de julho de 1932; sua atuação no território gaúcho, sua posterior convocação e atuação no contexto paulista em 1932 e, por fim, seu retorno ao Rio Grande do Sul e, por fim, sua dissolução no ano de 1935.

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É importante frisar que as forças provisórias após sua constituição, estavam subordinadas “[...] ao comando e regulamento da Brigada Militar enquanto existiram, [e] é, óbvio, fizeram parte integrante da corporação[...]”’ (RIBEIRO, 1987, p. 253). Neste contexto, as tropas auxiliares, durante todo o tempo em que estiveram mobilizadas e em atuação, assumiam a doutrina da Corporação e, assim, vivenciavam seus regulamentos.

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A cronologia da atuação do 3º Corpo Auxiliar, sediado no município de Palmeira (hoje Palmeira das Missões), inicia-se com sua organização efetiva, a partir das determinações impostas pelo Decreto Estadual nº 5.011, de 11 de julho de 1932 “Organizado com elementos do município de Palmeira e do Iraí[1], logo aos primeiros dias da revolução, marchou pouco depois para Passo Fundo” (RIBEIRO, 1987, p. 260) e, em seguida, para São Paulo.

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A atuação do 3º Corpo, em território gaúcho decorre de ações de apoio a causa paulista, insufladas por líderes políticos estaduais. Nesta perspectiva, tem-se que “[…]  alguns municípios que apoiaram a causa paulista foram Caçapava do Sul, Cerro Alegre, Lagoa Vermelha, Pelotas, São João, São Sepé e Vacaria. No Vale do Taquari, pode-se citar Encantado e Lajeado” (LAROQUE, TROMBINI, 2015). O apoio oferecido por estes municípios possuía uma inequívoca natureza política e expressava uma forma de oposição, por vezes individuais (quando as lideranças políticas locais se opunham à Vargas, e assim mobilizam forças políticas e militares graças a sua posição social e sua capacidade de exercício do poder, desconsiderando a população local) ao Governo Provisório e, foi expressado a partir de movimentos militares.

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Em resposta a estes municípios, o governo estadual rio-grandense mobilizou a Brigada Militar e os Copos Auxiliares, de modo que “todos os levantes foram reprimidos pelas forças militares do interventor do Estado, Flores da Cunha, que ficaram do lado do governo federal e reprimiram, sendo muitos mortos e presos, sem sucesso de vitória” (LAROQUE, TROMBINI, 2015). É com esse sentido de reação aos levantes (ou tentativas) municipais gaúchos que o 3º Corpo Auxiliar em 1932 atuou no território. Foi uma resposta do governo estadual à ação de lideranças político-militares opositores do arranjo político estadual e ao Governo Provisório. Assim:

 

Quando o dr. Batista Luzardo e outros políticos infensos à situação governante do Estado pretenderam levantar em armas a região do Nordeste, o 3º Corpo recebeu ordem de ocupar a cidade de Lagoa Vermelha, antes que aqueles o fizessem.  (RIBEIRO, 1987, p. 260)

 

Com uma atuação rápida, o 3º Corpo em poucos dias debelou as atividades pró - São Paulo na região nordeste do estado, “e, em marchas forçadas, cumpriu a missão, sendo isso um dos fatores que contribuíram para o fracasso da intentona, no Rio Grande do Sul” (RIBEIRO, 1987, p. 260). De forma rápida e, até mesmo discreta, visto que os embates militares foram pouco significativos, os soldados de Moura Assis contribuíram com o processo de repressão aos revolucionários rio-grandenses, abrindo caminho para prisões e exílios.

 

 

 

3º CORPO AUXILIAR DE 1932: UMA CRONOLOGIA

 

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A atuação do 3º Corpo Auxiliar gaúcho em 1932 possui três momentos: o primeiro, interno, caracterizado por manobras no território rio-grandense. Tem início com sua criação em 11 de julho e segue até 03 de agosto de 1932, quando recebe ordens para seguir para São Paulo. O segundo momento, externo, compreende o período em que a corporação atuou no território paulista, tendo como referência o dia 06 de agosto, data de seu embarque em Passo Fundo e segue até o dia 1º de outubro de 1932, data de sua última batalha no Setor Sul. O terceiro momento, novamente no plano interno, tem início com o retorno da corporação ao Rio Grande do Sul e segue até o ano de 1935 quando ocorre sua dissolução.

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A cronologia a seguir compreende o segundo momento de atuação do 3º Corpo Auxiliar, no qual são encetadas as ações da corporação no front do Setor Sul na Revolução Constitucionalista de 1932. Esta descrição estrutura-se a partir das obras “O Pé-no-Chão: o pé de Palmeira no chão de São Paulo” (1937; 2ª ed. 1958), de Nicolau Mendes, e “Esboço histórico da Brigada Militar do Rio Grande do Sul” (volume III, de 1987), de Aldo Ladeira Ribeiro. A obra de Ribeiro faz importante registro da atuação da Brigada Militar rio-grandense no período de 1930 a 1961 e assim, preservando a voz do próprio tenente-coronel Serafim de Moura Assim, comandante do 3º Corpo Auxiliar na campanha de 1932, além de outros chefes militares.

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Buscamos enfatizar nesta linha de tempo, a ordem cronológica das ações empreendidas, ou que tenha tomado parte, pelo 3º Corpo Auxiliar, do momento em que recebeu ordens para seguir para São Paulo, até o anuncio do fim do conflito em pleno campo de batalha, no dia 03 de outubro de 1932. Segue-se a essa informação, a descrição ipsis litteris apresentadas pelas obras citadas, seguidas, por fim, da referência bibliográfica.

ASSIM, TEMOS:

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03 DE AGOSTO DE 1932:

“Lá pelas imediações do Mato Castelhano um próprio encontrou a força. Trazia ordens ao coronel Serafim de Moura Assis, para que apressasse a marcha, pois se tornava indispensável a saída do 3º Corpo para fora do Rio Grande. [...] O 3º Corpo que já vinha em marchas forçadas, forçou-as mais ainda [...]” (MENDES, 1958, p. 33).

 

06 DE AGOSTO DE 1932:

“7 horas da manhã. [...] nos trilhos, uma composição da viação férrea esperava. [...] Acompanhado de grande massa de povo, o 3º Corpo embarcava, então, debaixo do entusiasmo reinante, iniciando-se, dessarte, a marcha para o ‘front’, para a frente Sul de São Paulo, onde iria encontrar o seu Jordão...”. (MENDES, 1958, p. 25).

 

12 DE AGOSTO DE 1932:

“Ainda em viagem, a 12 de agosto, foi mandado apressar a marcha e apresentar-se, com urgência, ao general Waldomiro Lima, cujas forças estavam empenhadas em combate” (RIBEIRO, 1987, p. 260).

 

O 3º Corpo Auxiliar passa “[...] em Faxina [SP], base da aviação legalista [...] [e, logo] chega à “[...] estação Floresta, aquém de Buri, onde, às 22 horas, aquele comandante [Moura Assis] se apresentou ao general Lima, que o felicitou pela rapidez com que acorrera ao seu chamado” (MENDES, 1958, p. 28).

 

13 E 14 DE AGOSTO DE 1932:

“Reunido às demais forças legais, na noite de 13 para 14, o general convocou os comandantes de corpos às suas ordens, para dar missão a cada um, no ataque a ser levado às posições adversárias. Ao 3º Corpo Auxiliar e 8º de Infantaria coube atacar a boca da picada que, de Buri, vai ao Capão Bonito. Aquele Corpo marcharia pela várzea que precede a picada. Atacaria pela esquerda, enquanto que o 8º Regimento marcharia mais resguardado e atacaria pela direita. Esse ataque deveria ser desfechado a 14, sendo depois adiado para a manhã de 15. ” (RIBEIRO, 1987, p. 260).

 

15 DE AGOSTO DE 1932:

Ocorre o combate na região da “Boca da Picada, que vai de Buri a Capão Bonito [...] [e região do] varzedo do [rio] Apiaí [...]” (MENDES, 1958, p. 30, 31).

 

Relato de Moura Assis:

“O armamento da força era quase todo velho. O coronel Canabarro havia remetido pelo 5º Batalhão da Brigada doze automáticos Colt. O 5º só chegou às quatro horas da madrugada. Em virtude desta demora e de não ter técnicos, só pude utilizar-me de dois, pois que, às sete horas, já o 3º marchava para tomar posição de combate. Escalei o major Reis e primeiro esquadrão, sob o comando do capitão Laudelino Carvalho, para fazer a vanguarda e iniciar o ataque, marchando os outros esquadrões, segundo a ordem numérica, a um de fundo, por dentro da restinguinha da costa do rio Apiaí. A nossa artilharia, composta de doze peças, abriu fogo por cima de nós. A inimiga respondeu, atirando sobre nossos companheiros, que ficavam mais distantes, no flanco esquerdo, porque não nos enxergava. Aproveitamos uma pequena vertente que desagua no Apiaí e, a duzentos metros das trincheiras, fomos pressentidos pelo adversário, que abriu cerrada fuzilaria, ao que o terceiro esquadrão respondeu, travando-se, então, o combate às oito horas da manhã. A neblina que caia, muito facilitou a nossa aproximação. O resto da coluna teve de estacionar a seiscentos metros do inimigo. Mandei imediatamente o capitão Godói estender linha à esquerda, visto que o adversário nos hostilizava desse lado. Parte do segundo esquadrão reforçou o primeiro. O combate tornava-se cada vez mais violento. As duas da tarde, a fuzilaria das forças amigas, que se debatiam à esquerda do 3º, para lado da estação Carmilo, já era menos densa, enquanto a nossa fuzilaria continuava com a mesma intensidade. As três horas, recebi pedido de munição; tínhamos, então, já trinta e tantas baixas. Pouco depois, recebi uma ligação do bravo tenente Quadros de Carvalho, da Polícia Catarinense, e que se achava à minha retaguarda; pedi-lhe o concurso de uma seção de metralhadoras, no que fui imediatamente atendido. Disse-lhe que assentasse as peças, indicando-lhe o lugar a uns quinhentos metros do inimigo e cem na minha frente, em uma elevação do terreno, para atirar por cima de minha linha de frente, pois o terreno assim o permitia, dada a posição do inimigo. Os terceirianos, pouco a pouco, iam se remuniciando e lentamente avançando. Já ninguém podia levantar-se, que não caísse ferido ou morto. A nossa artilharia, que havia silenciado, abriu novamente formidável fogo, o qual, dado a competência do major Catulo e de seus artilheiros, não atingiu nossas fileiras, já tão próximas do adversário. As cinco e meia horas, a nossa aviação também bombardeava a posição inimiga. Nas outras posições, já havia cessado o fogo. Quase às seis horas, já sem munição, notei que alguns paulistas corriam da ponta das trincheiras para o mato. Gritei à soldadesca que carregasse e, como uma onda, levantamos da macega, correndo em direção ao inimigo em desordem e não havíamos corrido cem metros já a linha de frente gritava, de facão em punho, nas bordas das trincheiras inimigas, saltando os arames farpados. Estava ganho o combate; caiu a noite, tratou-se de reunir alguns feridos e mortos, que estavam pelo campo, ocupou-se as trincheiras para pousar nelas, sem comer nem beber e cansados. Teve o corpo oito mortos e trinta e quatro feridos." (Serafim de Moura Assis in RIBEIRO, 1987, p. 260, 261),

 

16 DE AGOSTO DE 1932:

Telegrama do General Valdomiro Lima, comandante militar legalista do Setor Sul, ao interventor federal do Rio Grande do Sul, General José Antônio Flores da Cunha:

 

"General Flores da Cunha. Porto Alegre. De Burí. 16/8. Combate ontem a leste e norte Burí aprisionamos oitenta rebeldes, que tiveram grande número baixas. Batalhão tenente coronel Serafim Moura Assis portou-se com inexcedível bravura, tendo sete mortos e trinta e dois feridos. Estamos aniquilando últimas resistências. Prossegue ofensiva. Abraços. Gen. Lima." (General Valdomiro Lima in RIBEIRO, 1987, p. 262).

 

18 DE AGOSTO DE 1932:

“[...] O indômito ‘Pé-no-chão’ permanecia guarnecendo a mesma frente – boca da picada de Capão Bonito - numa extensão de dois quilômetros, e onde o inimigo, fortemente entrincheirado, aguardava”. (MENDES, 1958, p. 49).

 

Relato de Moura Assis:

"Combinamos com o capitão Tinoco, que era o representante do general, que viesse o coronel Braga (Jerônimo Teixeira Braga), com o restante do 17º Corpo Auxiliar (um esquadrão já fora adido anteriormente ao 3º), por uma picada velha que mandei reabrir na costa do rio Apiaí, encurtando, assim, a distância, para podermos atacar o inimigo pela retaguarda. (Serafim de Moura Assis in RIBEIRO, 1987, p. 262).

 

25 DE AGOSTO DE 1932:

Relato de Moura Assis:

“A 25, o coronel Braga incorporou-se ao 3º e havíamos feito ligação com o 9º Regimento de Cavalaria Independente. O inimigo era numeroso — mil e oitocentos homens —, segundo asseverou o coronel Arlindo, pouco vigilante, pois que não nos havia descoberto. ” (Serafim de Moura Assis in RIBEIRO, 1987, p. 262),

 

26 DE AGOSTO DE 1932:

Relato de Moura Assis:

“A 26, depois de termos organizado o plano, iniciou-se o ataque pelo primeiro esquadrão e uma seção de metralhadoras pesadas do 5º Batalhão da Brigada, sob o comando do tenente Valfrido Pereira Gomes, a qual, dias antes, passara a servir junto ao Corpo, atacando essa força pela direita. O 17º Corpo Auxiliar atacou de frente e o 9º Regimento de Cavalaria, da margem oposta do rio, também abriu fogo, travando-se, assim, o combate. Enquanto isso, eu, com o resto do 3º Corpo, entrei por um pique que mandara abrir indo sair na picada Burí - Capão Bonito, onde permanecemos ocultos, aprisionando diversos rebeldes paulistas (todos acadêmicos), que por ali passavam. O capitão Godói, com parte do quarto esquadrão, ficou postado em outra picada, à esquerda, defrontando as posições inimigas. O combate do Mineiro continuava intenso. Mandei o major Reis tomar novo dispositivo, mais à direita. O 5º da Brigada e a artilharia empenhavam-se em cerrada fuzilaria com os paulistas, que guarneciam a picada de Burí. Mandei o capitão Godoi abrir fogo com o seu pessoal, sobre o inimigo que estava na trincheira e, em seguida, carregar, pondo-o em debandada. Mas, não pudemos avançar mais, porque a nossa artilharia e o 5º já nos estavam alcançando com seus tiros, pois estávamos à retaguarda do inimigo, que corria em direção à estrada que vai a ponte da Manteiga. Com isto, a picada Buri - Capão Bonito ficou limpa de inimigos, indo eles se entrincheirar no Fundão, do outro lado do Paranapitanga. A linha, que mandei para a nova posição, sob o comando do major Reis, ocupou-a. O destemido tenente Tézinho e Osorio Marques, que até então era sargento, forçam o flanco direito do inimigo, no Mineiro, juntando-se ao tenente Tézinho mais um pelotão do 17º, sob o comando do tenente Machado. O valoroso tenente Valfrido avança com a seção de metralhadoras, para colocar suas peças numa saliência do terreno, a uns quinhentos metros do inimigo, quando encontra-se com o comandante paulista, coronel Arlindo, que vinha, com uns trinta homens, em auxilio de seus companheiros; em ligeira escaramuça, a força legal matou oito revolucionários, fugindo os demais. Pouco depois, o coronel Arlindo era feito prisioneiro, porque, tendo errado o caminho, na fuga, fora dar em uma posição ocupada por elementos do 3º Corpo. Após mais alguns ligeiros encontros parciais, terminaram gloriosamente, no dia 26 de agosto, os diversos encontros do 3º, nos matos e capoeiras, entre Paranapitanga e Apiaí; todo o inimigo, que se achava na frente do 3º, fora batido e extraviado; o bravo coronel Arlindo estava preso. Após esse combate, dirigi ao general Flores da Cunha, o seguinte comunicado: - ‘Depois do combate dia 15, 3º continuou vencendo, tomando trincheiras, infiltrando-se flanco esquerdo inimigo, mato, brigando todos dias. Hoje, dia 26, conseguiu 3º prender luta coronel Arlindo, comandante força paulista, mais onze estudantes, infligindo pesadas baixas, resultando fuga inimigo direção Capão Bonito. Não tivemos baixas devido condições terreno. Continuo vanguarda. Corpo entusiasmado. Tomamos duas metralhadoras, muitos fuzis novos, ambulância, etc.’ (Serafim de Moura Assis in RIBEIRO, 1987, p. 262, 263).

 

 

28 DE AGOSTO DE 1932:

“Depois que o 3º Corpo acampara na picada Buri-Capão Bonito, no dia 28 de agosto, altas patentes conceberam o plano de ataque ao Fundão, que levaram a efeito com pleno sucesso”. (MENDES, 1958, p. 72, 73).

 

Telegrama Ten. cel. Dorneles para o Gen. Flores da Cunha:

"General Flores da Cunha. Porto Alegre. De Burí. 28/8. Dia 26, após feliz ataque flanco e frente, conseguimos desalojar rebeldes desfiladeiro Buri - Capão Bonito, uma das mais fortes posições inimigo. Fizemos grande presa, muitos prisioneiros, inclusive próprio comandante rebelde, major Arlindo Oliveira, mesmo que dia 12 atacou meu flanco intenção prender-me e que foi desbaratado. Ação 26, distinguiram-se, além outros, 3º e 17º Corpos Auxiliares e 5º Batalhão Brigada Militar. 3º Corpo possui um grande chefe, que é o major Reis. Tivemos um sargento morto 17º e um soldado ferido 5º Batalhão. Saudações Tenente coronel Argemiro Dorneles, Comandante Destacamento." (Tenente coronel Argemiro Dorneles in RIBEIRO, 1987, p. 277).

 

Telegrama Ten. cel. Van Erven para Gen. Flores da Cunha.

"General Flores da Cunha. Porto Alegre. De Curitiba. 28/8. Em complemento notícia dada pressa grande vitória Coluna Sul, informo pormenores grandioso feito: — Travou-se hoje violenta batalha entre as forças legais, do comando do sr. general Valdomiro Lima, e os rebeldes, do comando dos coronéis Arlindo e Heliodoro e capitão Cândido Braga. A ação teve início há dois dias, intensificando-se ontem e tomando proporções extraordinárias hoje, pela madrugada, continuando pelo dia todo e terminando agora à noite. Os combates foram dirigidos em pessoa pelo sr. general, que teve o seu P.C. numa das trincheiras avançadas, próximo às primeiras linhas paulistas. A ação desenvolveu-se na frente de Burí, nas proximidades e eixo da estrada de rodagem que liga esta vila a Capão Bonito, obedecendo aos planos pré-estabelecidos pelo comando em chefe, tendo em mira o envolvimento do inimigo, que assim surpreendido não resistiria ao ataque. As forças constitucionalistas estavam entrincheiradas numa posição dominante, em coxilhas ao longo da estrada, de maneira a impedir o acesso às forças legais pelo centro, que era varrido constantemente por vivo fogo de metralhadoras pesadas. Em tais condições, só a artilharia poderia atenuar a intensidade do fogo inimigo, permitindo o avanço das forças atacantes. Essa missão foi entregue às baterias do 9º Regimento de Artilharia Montada, 3º Grupo de Artilharia Pesada e 5º Grupo de Artilharia de Montanha, que passaram depois de forte preparação a apoiar a progressão do 2º Batalhão de Caçadores de Pernambuco e 5º Batalhão gaúcho. Enquanto a artilharia fixava a frente inimiga num bombardeio ensurdecedor de shrapnells e granadas, os 3º e 17º Corpos provisórios gaúchos e 9º Regimento de Cavalaria Independente, numa rápida ação de envolvimento, estabeleciam formidável círculo de ferro em torno das tropas insurretas. Rompido o fogo e mobilizadas as forças, o combate tomou grandes proporções, culminando na mais estrondosa das vitórias até agora obtidas pelas forças ditatoriais. Como prova insofismável da grande vitória obtida, aí estão prisioneiros do sr. general Valdomiro Lima, o comandante e estado maior das forças rebeldes, coronéis Arlindo e Heliodoro, vários outros oficiais e grande número de soldados, que estão chegando dos diversos recantos onde se ferira a batalha. Completando a vitória, as forças legais apreenderam metralhadoras pesadas, fuzis-metralhadoras, grande quantidade de material bélico, animais, automóveis, mantimentos. O coronel Arlindo, que fora revolucionário em 24, é genro do ilustre general João Francisco, comandante em chefe das forças que operam na região de Cambará-Ourinhos. Portaram-se com grande heroísmo soldados legais Destacamento Dorneles, cujo chefe salientou-se pela bravura, energia e sangue frio, demonstrados nas diversas fases da memorável campanha. Forçoso é reconhecer que a presença do comandante em chefe nas trincheiras foi fator decisivo vitória e o sr. general Lima, acompanhado dos primeiros tenentes Trota, chefe da segunda seção estado maior, capitão Branco Pedroso e tenente Moreira Lima, ajudantes de ordens, capitão dr. Luiz Parigot, médico, e os comandantes das diversas unidades, acompanhou e dirigiu o desenvolvimento do combate, afrontando com extraordinária coragem os perigos decorrentes do cruzamento de fogos a que estava sujeito o seu P.C., durante várias horas. Foram oficiais de ligação entre o Destacamento e o comando em chefe o sr. major Cordeiro de Faria, capitão Nelson Tinoco, dois bravos e arrojados oficiais do Exército, que se portaram com inexcedível bravura. Saudações cordiais. Ten. Cel. Van Erven. Assistente Militar Interventor Paraná." (Ten. Cel. Van Erven in RIBEIRO, 1987, p. 277, 278).

 

30 DE AGOSTO DE 1932:

“No dia 30, o coronel Serafim destacou os capitães Pedro Godói e Tibúrcio dos Santos Fortes, para, com seus esquadrões, forçarem a perigosa passagem da ponte Manteiga. Junto, seguiu o pelotão do bravo tenente Osório Marques. O tenente Saul Missel, que levara ordens especiais, acompanhou-os.” (MENDES, 1958, p. 74)

 

31 DE AGOSTO DE 1932:

“No dia 31, último do mês de agosto, a artilharia iniciou o bombardeio às posições inimigas do Fundão. A tropa pernambucana, com o valor de costume, avançou 500 metros, abrindo fogo, que foi respondido, incontinenti, pelos paulistas. O combate começou. [...] Os tercerianos, porém, longe de se intimidarem, passavam aqueles ‘ninhos’ [ (trincheiras paulistas) ] destroçando-os, matando e prendendo gente. ” (MENDES, 1958, p. 75)

 

Relato de Moura Assis:

“Depois de alguns dias empregados na preparação de novo plano de ataque, no dia 31, a artilharia iniciou o bombardeio às posições inimigas do Fundão. Os pernambucanos avançaram quinhentos metros além de sua posição anterior, abrindo fogo. Os paulistas responderam de suas trincheiras, estava travado o combate. O capitão Godói, que comandava o ataque pela retaguarda, seguia encoberto pela capoeira. Às duas da tarde, o capitão Godói abriu fogo, quase à retaguarda do inimigo, que, batido pela nossa artilharia, metralhadoras do 8º Regimento de Infantaria, do comando do capitão França, e pernambucanos, havia recuado, afim de evitar o envolvimento, travando-se forte fuzilaria. Os terceiriarios avançaram e os paulistas procuraram escapar pela estrada geral que vai a Capão Bonito, o que faziam correndo em debandada. O capitão Godói avançava, correndo, com os esquadrões, porém os paulistas já haviam tomado precaução de preparar pequenas trincheiras para armas automáticas, as quais abriam fogo em proteção ao pessoal que fugia. Mas, os soldados do 3º não se intimidavam, avançavam nos redutos e os destroçavam imediatamente. Em um destes ninhos, o capitão Godói ficou com o braço direito esfacelado por bala, quando avançava para tomá-lo, apenas com quatro soldados. Quase morto, esvaindo-se em sangue, foi carinhosamente atendido pelo médico da força pernambucana. Os paulistas haviam posto fogo no campo, onde iam deixando seus mortos e feridos. Estes os nossos soldados arrastavam para o meio da estrada, afim de evitar que morressem queimados. Surpreendidos por pessoal do 3º Corpo parte dos paulistas começavam a render-se, quando o major Reis, ignorando essa circunstância, acedeu em conceder uma trégua até as oito horas do dia seguinte, pedido pelo coronel Anchieta, e da qual se aproveitaram os paulistas para fugarem, durante a noite, em direção ao rio das Almas. Teve o 3º Corpo, nesse dia, onze baixas, sendo dois mortos e nove feridos, entre estes o capitão Godói, que teve o braço amputado. Quanto ao inimigo, pode se dizer que teve fim a sua falada Legião Negra, da qual foram feitos cinquenta e sete prisioneiros, sendo elevado o número de mortos e feridos." (Serafim de Moura Assis in RIBEIRO, 1987, p. 263, 264).

 

Telegrama Ten. Cel. Dorneles para gen. Flores da Cunha:

"General Flores da Cunha. Porto Alegre. De Burí. 31/8. Nesta hora acabo de bater rebeldes no Paranapitanga, após violenta luta. Continuo sua perseguição proximidades Capão Bonito. Entre outras tropas, teve também saliente papel bravo 3º Auxiliar. Amanhã mandarei detalhes. Saudações. Tenente coronel Dorneles. Comandante Destacamento" (Dorneles, in RIBEIRO, 1987, p. 264).

 

1º DE SETEMBRO DE 1932:

“O dia 1º de setembro veio encontrar o lendário ‘Pé-no-chão’ em marcha para Capão Bonito [...]” (MENDES, 1958, p. 82).

 

“De 1º a 14 de setembro, o 3º Corpo Auxiliar ora repousava, conforme as circunstâncias o permitiam, ora auxiliava a força paraibana a manter suas posições.” (RIBEIRO, 1987, p. 264).

 

03 DE SETEMBRO DE 1932:

Telegrama Ten. cel. Braga para o Com. Brigada Militar RS:

"Comandante Brigada Militar. Porto Alegre. De Capão Bonito. 3/9. Após combate 31, inimigo fugiu desordenadamente diante Destacamento Coronel Dorneles, qual fazia vanguarda Batalhão e 3º Corpo Provisório, abandonou todas posições, não resistindo ímpeto nossa tenaz perseguição. Conquistamos mais quinze quilômetros terreno, ocupando Capão Bonito, principal ponto resistência. Nossa tropa não desmentiu honrosas tradições Rio Grande Sul, portando-se desmedido denodo e bravura. Saudações. Ten. Cel. Jeronimo Braga." (BRAGA in: RIBEIRO, 1987, p. 279).

 

05 DE SETEMBRO DE 1932:

Telegrama Ten. cel. Dorneles para Gen. Flores da Cunha:

"General Flores da Cunha. Porto Alegre. De Capão Bonito. 5/9. Conforme prometi nobre amigo, mando alguns detalhes combates Paranapitanga, Serraria. Fizemos cerca duzentos cinquenta prisioneiros, vinte caminhões, alguns cheios, vários objetos, mais de duzentos fuzis, metralhadoras, fuzis-metralhadoras, trezentos capacetes aço e infinidade outros objetos. Atuaram muito destaque 3º e 17º, principalmente companhia capitão Tozzi, do 17º. Esse grande êxito permitiu tomada Capão Bonito e progressão Destacamento Boanerges, deve-se atuação invulgar 9º Regimento Cavalaria Independente, do grande, bravo major Barreto. Fez movimentos envolventes incríveis de tão audaciosos. Nenhum soldado 9º Regimento queria tomar conta cavalos de mão, todos corriam primeira linha. Ocupamos Capão Bonito dia 2, manhã, e aguardo apenas ordem nosso chefe atropelar novamente inimigo, que não tem envergadura resistir ímpeto avançadas gaúchas. Tivemos algumas baixas ferimentos, maioria leves. Saudações. Tenente coronel Dorneles." (DORNELES in: RIBEIRO, 1987, p. 279).

 

 

06 DE SETEMBRO DE 1932:

Telegrama Ten. cel. Braga para Gen. Flores da Cunha:

"General Flores da Cunha. Porto Alegre. De Capão Bonito. 6/9. Apresento ao denodado e bravo chefe nossas saudações cordiais pela vitória conquistada inimigo, com concurso tropa rio-grandense fazia parte primeiro escalão, combate 30 e 31, desalojando inimigo todas posições percurso cerca quinze quilômetros até reduto final sua extensa linha Capão Bonito. Nosso Batalhão e 3º Corpo Auxiliar portaram-se verdadeiros heróis. Prisioneiros declaram ser impossível conter tão grande espírito ofensiva nossa heroica tropa. Ten. Cel. Jeronimo Braga. Comandante 17º Corpo Auxiliar." (BRAGA in: RIBEIRO, 1987, p. 279).

 

07 DE SETEMBRO DE 1932:

“[...] o 3º Corpo recebeu, do general Lima, ordem para avançar [para o rio das Almas em auxílio das forças paraibanas] [...]. E foram os heroicos tercerianos, com a mesma coragem tranquila, tanta vez demonstrada, ocupar-lhes o flanco esquerdo, em coluna por um, pela costa da restinga, para evitar as bombas e a metralhadora dos aviões paulistas que, impertinentes, hostilizavam as forças governamentais.” (MENDES, 1958, p. 85).

 

09 DE SETEMBRO DE 1932:

“[...] Ao debaldar o dia 9, os rebeldes iniciaram a ofensiva. Numa baixada se encontrava a sentinela da força gaúcha, firme no posto. Tentaram os paulistas aprisioná-lo, no que foram malsucedidos, porque o sodado não se assustou, atirando contra eles e escapando-se para junto dos companheiros, enquanto estes, que haviam observado toda a cena, reagiram fortemente, desbaratando-os. Este rápido encontro deu ao 3º Corpo maior nomeada entre as corporações ditatoriais, que, admiradas, notaram o grande pavor que os revolucionários tinham do ‘Pé-no-chão.’” (MENDES, 1958, p. 87).

 

10 DE SETEMBRO DE 1932:

“Os paulistas continuavam os tiroteios, levando a efeito pela madrugada do dia 10, novo ataque às linhas governistas, sem o mínimo resultado, visto que, outra vez, retiraram em visível desordem.” (MENDES, 1958, p. 87).

 

15 DE SETEMBRO DE 2019

“No dia 15, os paulistas trouxeram um ataque geral à frente das tropas legais, mas foram severamente repelidos, sofrendo pesadas baixas. Depois de cerrada fuzilaria, o 3º Corpo avançou, procurando o entrevero, mas os atacantes fugiram.” (RIBEIRO, 1987, p. 264).

 

18 DE SETEMBRO DE 1932:

Relato de Moura Assis:

"A noite, fui chamado ao P.C. do coronel Dorneles, para combinarmos e receber ordens, para o grande combate do rio das Almas. Lá, todos reunidos, os comandantes do 8º Regimento de Infantaria, dos pernambucanos, do 14º, do 9º Regimento de Cavalaria Independente, do 5º Regimento de Artilharia Montada, do 7º e eu, depois de discutirmos os prós e contras do combate, o nosso comandante nos deu a seguinte ordem escrita: — "Ordem de Operações do Q.G. do Destacamento Dorneles. Capão Bonito. 18/9/932. Às oito horas. — I — O nosso Destacamento vai atacar as posições inimigas, procurando atirar o inimigo para o outro lado do rio das Almas. II— Farão o ataque o 3º Corpo Auxiliar e o 14º Regimento de Cavalaria Independente, em cooperação com o 9º Regimento de Cavalaria, que atacará o flanco ou a retaguarda. III – O ataque será protegido pela companhia do 5º Batalhão de Caçadores, que está na região da fazenda Santa Inês, pela bateria do 5° Regimento de Artilharia Montada, que está em apoio direto à nossa frente. IV —Será iniciado às dez horas e a bateria do 5º Regimento de Artilharia baterá às dez e trinta as trincheiras inimigas assinaladas à direita do capão que fica em frente ao 3º Corpo Auxiliar e as que se estendem até a margem direita do rio das Almas. V — A companhia de metralhadoras agirá de acordo com o 9º Regimento de Cavalaria. VI — O 1/8º Regimento de Infantaria e o 7° Regimento de Infantaria farão a pressão que as circunstâncias indicarem em cada setor. VII — Estarei junto ao P.C. do 5º Regimento de Artilharia, ao lado da estrada de rodagem. Coronel Argemiro Dorneles. Comandante do Destacamento." Escalei quase todo o 3º Corpo para o ataque, sob o comando dos bravos tenentes Alvim Dias, com o terceiro esquadrão, Dorvil Júlio, comandava o quarto, Taurino Cunha, com parte do segundo, e Saúl Missél, com um pelotão do primeiro. Em proteção, à curta distância, constituindo a linha de segurança, os pelotões sob o comando dos bravos tenentes Nicanor Almeida, João Paz, Osorio Marques e Inérito Lima; e o posto de remuniciamento estabeleci mais à retaguarda, sob o comando do primeiro tenente Pedro Paulo, do quinto esquadrão, deixando de ocupar no combate este esquadrão, sob o comando do valente e disciplinado capitão Pompilio Silva, por ser uma gente recém-chegada do Rio Grande. Durante o combate, estabeleci o meu P.C. junto a artilharia, para observar o avanço do 3º e pedir os tiros da artilharia contra as posições inimigas, onde se achavam armas automáticas. Vou dar, a seguir, a esta narrativa, a cópia da ordem do dia feita pelo meu competente secretário, acadêmico Tarso de Moraes Dutra, com os retoques acima que não se achavam registrados: "Após o memorável combate de Buri e depois da rápida passagem pela zona do Capão Bonito, nossas tropas, levando pela frente o inimigo, detiveram-se ante o rio das Almas, afluente do Paranapanema, a fim de se reorganizarem e ao mesmo tempo estabelecerem um novo plano de ataque, que o terreno e o inimigo fortemente organizado impunham. O adversário se estabelecera em uma linha de elevações, na ala direita, tendo aproveitado ao máximo o terreno que particularmente lhe era favorável e possuindo ótimo comandamento sobre nossas tropas. As posições inimigas, preparadas com grande antecedência, estendiam-se por quase todo o curso do rio das Almas, batendo com precisão, suas armas automáticas, todos os acessos a margem daquele rio: Após cuidadoso estudo das posições inimigas, foi estabelecido o plano de ação e dada às tropas a ordem de ataque. O movimento, que devia processar-se de modo violento e decisivo, iniciou-se por uma infiltração no terreno inimigo, embora tendo que transpor diversos obstáculos, como a passagem do rio e, na outra margem deste, os pântanos e matagais queimados, onde o fardamento cáqui se destacava à distância, oferecendo bom alvo. A moral da tropa, apesar de tudo, era elevada. Dominava-a a vontade de vencer e avançou resoluta, apesar do inimigo tudo ter feito para impedir a aproximação do rio, tendo danificado as pontes e devastado os matos no lugar dos vaus, afim de ter melhor campo de tiro. Abandonando as posições, nossa linha lançou-se denodadamente sobre a crista da coxilha, fazendo tremenda fuzilaria contra os rebeldes. Encontrou, porém, fortíssima resistência, tendo o inimigo estabelecido cerrado fogo de barragem, sob o qual a progressão era quase impossível. O terreno, cortado por diversos afluentes do rio das Almas, dificultava a marcha e, ao mesmo tempo, facilitava o inimigo com a nossa fixação em diversos pontos. Nossa tropa não esmoreceu. A resistência inimiga tornava-se cada vez mais violenta e nos deteve sob um fogo contínuo até às quatro horas da tarde. A nossa oficialidade só tinha um anseio: era ocupar a colina, para avançar sobre o inimigo, fortemente entrincheirado na orla do mato, em frente a nós. A artilharia, coadjuvando a ação, manteve violento bombardeio às posições inimigas, sendo contrabatida pela artilharia inimiga e também atacada por fogos de metralhadoras pesadas. Os pelotões, lutando contra todos os obstáculos, progrediam sempre. As seis horas e cinquenta minutos, o coronel Serafim recebe a seguinte ligação do destemido tenente Saúl Missel: — "Ocupamos a crista da coxilha. O inimigo, composto do 8° e do 5º Batalhões da Força Pública de São Paulo, está fortemente entrincheirado na orla do mato e resiste com vantagem. Mande munição. O 9º Regimento de Cavalaria Independente ainda não deu sinal de vida e lutamos sozinhos, mas firmes. Já temos baixas. É conveniente artilharia bater as metralhadoras que estão à nossa esquerda. Já estabeleci, conforme ordem, o nosso posto de remunicamento. Primeiro tenente Saúl Missel." — Da linha de segurança, chegava também a seguinte: — "Deixe-nos avançar, por favor. Não podemos passar sem dar uns tirinhos. Tenente Osorio Marques." — Continuava sem cessar o fogo. Ao entardecer, nossa gente, tendo se aferrado ao terreno conquistado, preparava novos lances, apesar de ser impossível e imprudente a progressão. Foi preciso recorrer a artilharia, tal a violência dos fogos inimigos. Nossa artilharia deu vinte e cinco tiros, enquanto nossos tenentes tomam uma nova base de partida, para o avanço definitivo. O bombardeio da aviação fez-se sentir com uma intensidade tremenda e mesmo assim o inimigo resistia. Após os vinte e cinco tiros de canhão, nossa tropa, numa arrancada gigantesca, a peitos descobertos, como verdadeiros heróis embriagados pela vitória certa, arremete-se como uma onda de mar sobre as organizações constitucionalistas. Nada detém a avalanche de fogo, nem mesmo a fuzilaria infernal e formidável do inimigo. De todos os lados, os soldados do 3º Corpo deixam a encosta e os rebeldes tiveram que ceder, pois foram atacados ao mesmo tempo pela frente e pelo flanco. À frente dos heróis, tomba ferido mortalmente o sargento Sebastião Ortiz, soldado de uma rara e extraordinária bravura conhecida por todos os seus companheiros. A fuzilaria recrudesce, tendo o inimigo se refugiado nos bosques. O 3º Corpo Auxiliar tomou, triunfante e entusiasticamente, as formidáveis organizações inimigas, contando mais uma estrondosa vitória com o desbaratamento completo do adversário. Nossa viação tomou parte saliente nesse combate, hostilizando horas a fio, um poderoso inimigo e pondo em fuga a sua aviação. Ficou, com mais esta valiosa conquista de armas, jamais vencidas, reduzida a apregoada resistência das posições do rio das Almas, continuando nossas tropas, em rápida progressão, a recalcar o inimigo, que deixou variada cópia de munição de morteiro, de fuzil, barracas, granadas de mão, capacetes, roupas, etc. A resistência, embora fraca continuou ainda durante a noite." (Serafim de Moura Assis in RIBEIRO, 1987, p. 263, 264, 265, 266, 267).

 

25 E 26 DE SETEMBRO DE 1932

“O ‘3º Pé-no-chão’ bivacara aquém desse rio [Paranapanema]. Na margem oposta começou o pipocar da fuzilaria e as balas zumbiam por cima dos tercerianos [...]. Trocando ideias os comandantes das três unidades ali reunidas, traçaram o plano de ofensiva, que resolveram assim: - O 3º Corpo desceria pela encosta do rio; o 8º R.I. agrediria pelo centro; o 14º B. C. bem pela direita.” (MENDES, 1958, p. 110, 111).

 

Relato de Moura Assis:

“Nos dias 25 e 26, juntamente com o 8º Regimento de Infantaria, de Passo Fundo, e o 14º Batalhão de Caçadores, combatemos o inimigo na região da costa do rio Paranapanema, numa extensão de seis quilômetros, até a ponte do Souza. Daí em diante, sempre combatendo na região do rio das Almas e do Paranapanema, conservou-se o 3º Corpo Auxiliar, em conjunto com o 8º Regimento, até o fim da revolução.” (Serafim de Moura Assis in RIBEIRO, 1987, p. 267).

 

1º DE OUTUBRO DE 1932

“Na manhã de 1º de outubro, seguiram quatro pelotões tercerianos pelas [...] capoeiras [do rio Guapiara], três deles comandados, respectivamente, pelos tenentes Ernesto Machado, bravo de muitos combates, Pedro Paulo e Nicanor Almeida, e o outro pelo valente sargento Alfredo Vítor [com intenção de, secretamente, atingir a retaguarda inimiga]. [...] As 15,50 horas, se ouviu, finalmente, a gritaria do ‘Pé-no-chão’, que conseguira alcançar a retaguarda paulista e, a cem metros deles, rompera formidável fuzilaria. E, sem muita demora, aqueles que estavam descrendo da eficiência terceriana, puderam ver, não sem desapontamento, os rebeldes saltando desesperadamente do mato para o campo, debaixo duma atroada de bala e nomes feios, que os punham tontos! Os facões também davam o ‘ar da graça’, nesse atropelo...” (MENDES, 1958 p. 118, 119, 122) (grifo do autor).

 

 3 DE OUTUBRO DE 1932

 “O inimigo batido em toda parte, fora reorganizar-se, além do rio Turno. No dia 3 de outubro, quando os bravos do 8º R. I. chegavam, para, com o valoroso ‘Pé-no-chão’, levar outro ataque às novas fortificações paulistas, gritos e tiros em profusão, demonstrando desusada alegria, dos combatentes, anunciavam a paz tão almejada. [...].  Três de outubro é, para o Brasil, data duplamente feliz. Em 1930 – a regeneração de República. Em 1932 – o termo de inglória luta entre irmãos. ” (MENDES, 1958, p. 123, 124).

 

Relato de Moura Assis:

A 3 de outubro, finalmente, tendo pernoitado junto ao povoado denominado Taquaral, quando se preparava para bater o inimigo na margem oposta do rio Turvo, o 3º Corpo Auxiliar ouviu tiros e gritos; era a notícia do fim da revolução fratricida que regara o solo da Pátria bem amada, com o sangue generoso de seus filhos estremecidos." (Serafim de Moura Assis in RIBEIRO, 1987, p. 267).

 

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REFERÊNCIAS:

LAROQUE, Luís Fernando de Fontoura; TROMBINI, Janaíne. A Revolução Constitucionalista de 1932 no Rio Grande do Sul: o Combate do Fão em Municípios de Fontoura Xavier, Pouso Novo e Pregresso. Disponível em:<http://zanattalauro.blogspot.com/2015/06/ a-revolucao-cosntitucionalista-de-1932.html>. Acesso em fevereiro de 2019.

 

MENDES, Nicolau. O pé no chão: o pé de Palmeira no chão de São Paulo. Porto Alegre: La Salle, 1958.

 

RIBEIRO, Aldo Ladeira Esboço histórico da Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul: Outubro de 1930 a dezembro de 1961. Porto Alegre, Brigada Militar / M B M. 1987. V. 3.

 

NOTAS:

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[1]O município de Iraí foi criado em 1933, sendo até essa data, distrito de Palmeira das Missões. É possível que Ribeiro pretendesse fazer referência ao distrito do Parí (atual município de Tenente Portela, que se emancipou de Três Passos em 18 de agosto de 1955. Á época da Revolução Constitucionalista, Três Passos também pertencia a Palmeira das Missões. Mendes (1958, p. 136) ressalta que Moura Assis “[...] em 1923, como dissidente do Partido Republicano, militava nas hostes revolucionárias, comandando homens dos sertões da Fortaleza, e do Pari, atual tenente Portela, aonde fora buscar, em 1932 muitos dos mesmos elementos – sobretudo seus famigerados ‘tatetos’, dos fundões de Tenente Portela [...] para a reorganização do 3º Corpo.”.

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